fotos: Paulo Mafe
As danças campestres da Normandia e da Inglaterra, no século
XVIII, foram o grande berço das quadrilhas juninas. No século XIX, dos salões
nobres das cortes francesas, a dança espalhou-se por todo o continente europeu,
chegando ao Brasil com os portugueses ainda com características aristocráticas.
Num dinâmico processo de apropriação e ressignificações inerentes às expressões
culturais, a quadrilha foi se configurando com características bastantes
especiais. Retorna ao campo, fazendo parte dos festejos populares, geralmente
ligados às celebrações do período junino.
O Processo migratório campo-cidade
traz a quadrilha “matuta” para os centros urbanos, e transporta a ideia de uma
dança de origem caipira, com a figura do matuto com chapéu de palha, camisa
xadrez, bigode, dente pintado de preto e calça remendada, e as mulheres com
vestidos estampados, alguns remendados e cabelos arrumados em formato de
tranças. Personagem exóticos, que reforçam 
os preconceitos e estereótipos sobre a vida virtual, numa caracterização
exagerada.  Essa forma caricatural de ver
a quadrilha esbarra com a dinâmica do tempo histórico e com o contexto
sociocultural do Nordeste, particularmente no Recife, que apresenta um novo
modelo para o brinquedo, modificado esteticamente e no próprio conteúdo da manifestação.
Segundo o historiador Hugo Menezes, a partir dos anos  1980, o Recife vivencia um período marcado pelas
continuidades e mudanças. “É a época em que saem às ruas as primeiras
quadrilhas estilizadas. Quadrilhas diferentes que aos poucos abandonam a
representação caricatural recorrendo a uma releitura das vestes comuns à época
da corte, preocupando-se sempre com a junção dos elementos representativos na
cultura nordestina.
A musicalidade incorpora novos ritmos, algumas vezes
fugindo do gênero forró; as coreografias passam a ser ensaiadas e executadas de
acordo com a música, não dependendo mais das ordens do marcador. Foi um momento
laboratorial, de permissão para experimentar cores, músicas, formas e ações,
exercitar a criatividade e expor a dinamicidade das culturas populares, com
várias formas de ser e fazer”. 
Na década de 1990, continua Menezes, é a vez de o recriado
vir à tona como uma nova proposta. Foi um período de mudanças significativas
para a montagem das quadrilhas que passam gradativamente a buscar nas pesquisas
sobre o imaginário nordestino e mais especificamente do ciclo junino, a base
para a montagem do espetáculo. Todos os elementos apresentados passam a
relacionar-se com um tema previamente escolhido e pesquisado. 
A preparação de uma quadrilha transforma num verdadeiro
ritual, renovado anualmente com a criação de um novo tema e um novo São João.  Com o novo tema escolhido, as ideias se
expressam em sons, cores, ritmos, figurinos, adereços e infinitos tecidos e
variados materiais, relações heterogêneas que se sucedem e culminam numa ação
maior. São meses de trabalho constante. Extrema dedicação. O esforço conjunto é
a principal características dos momentos de encontro, seja para ensaiar as
coreografias, comprar tecidos, cortar, bordar, pintar os adereços, captar
recursos e etc. um verdadeiro espaço de sociabilidade.  
Cada grupo possui sua identidade própria, que se traduz no
formato do figurino, no estilo das coreografias, nas cores utilizadas, na
atuação do marcador, entre outros aspectos que levados para os arraias os
referendam historicamente e os legitimam. É assim com a Origem Nordestina,
Lumiar, Traquejo, Raio de Sol, Traque de Massa, Dona Matuta, Zabumba, Terror do
Alto, Tradição entre tantos outros grupos do Recife, Região Metropolitana e
Interior.
Fonte: RIBEIRO, Mário.  Cartilha Ciclo Junino – Prefeitura do Recife  / Secult / Fundação de Cultura do Recife, 2008.
 
